Com este título Funai perde a exclusividade na demarcação de Terras Indígenas foi publicada a notícia da descaracterização da Política Indigenista no Brasil, mais uma afronta do governo Dilma à Constituição Federal.
Orquestrada pela famigerada Bancada Ruralista e apadrinhada pela poderosa Ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, o governo decretou a intervenção na FUNAI, determinando que os estudos antropológicos de demarcação de terras indígenas seja feito pela Funai, mas com a aprovação do MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento), sede das políticas do agronegócio, do Ministério do Desenvolvimento Agrário, e da EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), cuja atuação tem sido fortemente voltada para o agronegócio.
Essa decisão evidencia a ausência total de comprometimento deste governo com os Povos e Nações Indígenas, assim como demonstrou também com relação ao Meio Ambiente. Leiam também: Boca Ferina: A Ditadura Ruralista e Boca Ferina: Carta aberta à Presidente Dilma Rousseff, nos quais apresento a questão ambiental, tão desprezada pelos latifundiários, com apoio irrestrito da presidente Dilma. Sua linha mestra de governo não contempla essas questões, sendo totalmente focada no Desenvolvimentismo (“desenvolvimento” a qualquer custo) e no Consumismo (“desperdício” como política de governo) como opções de crescimento econômico. Essa também foi a política de Lula e de FHC.
No artigo citado, os indígenas são tratados como invasores de terras produtivas, que os latifundiários alegam ser suas há mais de 40 anos. É verdade! No entanto, essas mesmas terras foram usurpadas de seus antepassados para serem doadas a famílias importantes do sul, como pagamento dos “esforços” brasileiros empreendidos na Guerra do Paraguai, lamentável episódio de nossa História, em que milhares de indígenas (paraguaios e brasileiros) foram assassinados no maior genocídio perpetrado pelo Estado Brasileiro em nome de um nacionalismo ultrapassado!
Diz o artigo:
“Coordenador da bancada federal e autor do pedido de audiência com a ministra Gleisi, Moka afirmou, após o encontro, que a medida torna mais justo o processo de identificação de áreas tidas como indígenas. “Não foi a decisão ideal, mas ao menos teremos uma análise mais próxima da realidade, pois as demarcações envolverão outros órgãos da União”, observa.”
“Moka lembra que existem 63 propriedades rurais invadidas em Mato Grosso do Sul. “A maioria das áreas invadidas pertence a famílias que estão ali há 40, 50 anos ou mais. Não é justo tirá-las de uma terra que foi passada de uma geração para outra, com título de posse”, argumenta.”
A Ministra e a “Presidenta” ignoram (desprezam) e atropelam os artigos 231 e 232 da Constituição Federal que dizem:
Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens.
§ 1º – São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições.
§ 2º – As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes.
§ 3º – O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei.
§ 4º – As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis.
§ 5º – É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, ad referendum do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco.
§ 6º – São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé.
§ 7º – Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, §§ 3º e 4º.
Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo.
Ora, todas as pessoas bem-intencionadas e minimamente cultas deste país sabem que quando os portugueses invadiram as terras brasileiras já havia aqui, há centenas de anos (talvez milhares), uma grande população de nativos, pertencentes a centenas de povos e etnias, falando mais de 200 línguas diferentes, que possuíam seu próprio modo de vida, seus costumes, suas tradições, suas crenças e sua cultura, diferentes em tudo das culturas europeias, e que souberam habitar as florestas e usufruir de seus recursos naturais sem destruí-los!
Vítimas de práticas execráveis, esses povos foram gradualmente massacrados, na tentativa de torná-los escravos, de modificar seus costumes e religiões, impondo-lhes as dos invasores, e chagando à situação atual, em que menos de 10% de sua população sobreviveu aos massacres e às doenças a eles transmitidas. Lamentavelmente, os órgãos governamentais que deveriam protegê-los (inicialmente o SPI – Serviço de Proteção ao Índio, e hoje a FUNAI – Fundação Nacional do Índio) fracassaram em sua missão primordial, por incompetência, má fé ou conluio com interesses escusos dos governantes e dos empresários.
Esses interesses visaram sempre a descaracterização de suas terras para uso na lavoura, na pecuária, na mineração, na construção de rodovias e de hidrelétricas, na exploração desordenada de nossos recursos naturais, o que nos levou à situação calamitosa em que nos encontramos. Hoje, 90% das terras do sul, sudeste e centro-oeste perderam suas florestas e poluíram seus rios, tornando essas regiões cada vez mais saturadas pelas atividades humanas. Por consequência, durante a ditadura militar de 1964 a 1985 a política expansionista desses governos avançou sobre a Amazônia, usando o falso “slogan”: “Integrar para não Entregar”!
A Transamazônica e as hidrelétricas trouxeram os latifundiários do Sul para a Amazônia! Hoje, Mato Grosso, Rondônia e Pará já estão com mais da metade de seus territórios completamente desmatados, ameaçando a sobrevivência da floresta e de seus habitantes: indígenas, animais e vegetação! Essa é a política de Dilma Rousseff, como foi de Lula e de FHC… essa é a origem da decisão de ontem!
Mato Grosso do Sul é apenas o ARÍETE que será utilizado para desmantelar a Política Indigenista: primeiro no SUL e CENTRO-OESTE, e depois se estendendo para todo o país. O resultado já sabemos: mortandade infantil de indígenas, enfraquecimento do Movimento Indígena (construído a duras penas e anos de sacrifício) e destruição do que resta de florestas, convertidas em agronegócio, com suas “belíssimas” pastagens e plantations (gigantescas monoculturas; latifúndios)!
Que os indígenas se cuidem! E que tomem URGENTEMENTE a decisão de reagir, antes que seja tarde demais! Que os bons políticos (eles existem???) e a Sociedade Organizada se manifestem! Que o mundo tome conhecimento do desastre social e ambiental que se anuncia na decisão de ontem!
Texto bem tendencioso e falso. O governo está agindo assim para evitar um desastre social. Só no RS a FUNAI quer desapropriar terras de mais de 30 mil famílias. Estas dezenas de milhares de pessoas não são seres humanos também? Não são brasileiros? O governo só tomou esta medida porque houve várias denúncias sobre fraudes nos laudos.
Vejo que quem comentou tem medo de se identificar… não tem importância: mesmo assim eu publiquei para que todos saibam o pensamento dos ruralistas! Tendencioso é o comentário, que considera vítimas os usurpadores dos territórios indígenas, enquanto que os verdadeiros donos da terra dela foram expulsos por invasores que se enriqueceram à custa de sua miséria e de seu sofrimento! É fácil argumentar que uma terra é produtiva e que sustenta dezenas de famílias! Mas e as famílias indígenas, não são eles seres humanos? Que justiça é essa que enxerga o mundo às avessas e olha o invasor como proprietário e os povos originários como bandidos? Que visão míope é essa que nega a esses pobres indígenas o direito às suas próprias terras, aproveitando-se da incompetência de governos, que deixaram, ao longo de décadas, que essas injustiças se eternizassem? Que justiça é essa que privilegia o fazendeiro e condena os indígenas à mendicância porque eles perderam suas terras, seus costumes, suas tradições, suas origens para um povo que veio de longe apenas para sugar da terra até o último respiro, até sua extrema exaustão, como o fazem outros gaúchos que habitam Mato Grosso, Rondônia, Roraima e Pará? É essa a justiça que se propõe aos Povos Indígenas do Brasil???
Quero esclarecer que, quando cito gaúchos que derrubaram florestas em Mato Grosso, Rondônia, Roraima e Pará para montar agronegócios de plantio de soja e criação de gado, não estou menosprezando o povo gaúcho dos Pampas, mas apenas mostrando a que o governo conduz quando não existem políticas de ocupação de terras para a agricultura e pecuária, e qualquer floresta pode ser derrubada, sem que isso se caracterize crime ambiental ou, mesmo caracterizado o crime, ninguém jamais será punido por cometê-lo. No mês em que se completa um ano da desconfiguração do nosso Código Florestal para atender aos interesses de uma minoria ruralista, vemos o novo avanço desses privilegiados em busca de novas terras, agora dos indígenas! Onde iremos parar?
ONDE ESTÁ ESCRITO QUE OUTRO MINISTÉRIO OU EMPRESA PÚBLICA PODE INTERFERIR NOS TRABALHOS DE DEMARCAÇÃO DE TERRAS INDÍGENAS?
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Presidência da República
Subchefia para Assuntos Jurídicos
DECRETO No 1.775, DE 8 DE JANEIRO DE 1996.
Dispõe sobre o procedimento administrativo de demarcação das terras indígenas e dá outras providências.
O PRESIDENTE DA REPÚBLICA , no uso da atribuição que lhe confere o art. 84, inciso IV, e tendo em vista o dis posto no art. 231, ambos da Constituição, e no art. 2º, inciso IX da Lei n° 6.001, de 19 de dezembro de 1973,
DECRETA:
Art. 1º As terras indígenas, de que tratam o art. 17, I, da Lei n° 6001, de 19 de dezembro de 1973, e o art. 231 da Constituição, serão administrativamente demarcadas por iniciativa e sob a orientação do órgão federal de assistência ao índio, de acordo com o disposto neste Decreto.
Art. 2° A demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios será fundamentada em trabalhos desenvolvidos por antropólogo de qualificação reconhecida, que elaborará, em prazo fixado na portaria de nomeação baixada pelo titular do órgão federal de assistência ao índio, estudo antropológico de identificação.
§ 1° O órgão federal de assistência ao índio designará grupo técnico especializado, composto preferencialmente por servidores do próprio quadro funcional, coordenado por antropólogo, com a finalidade de realizar estudos complementares de natureza etno-histórica, sociológica, jurídica, cartográfica, ambiental e o levantamento fundiário necessários à delimitação.
§ 2º O levantamento fundiário de que trata o parágrafo anterior, será realizado, quando necessário, conjuntamente com o órgão federal ou estadual específico, cujos técnicos serão designados no prazo de vinte dias contados da data do recebimento da solicitação do órgão federal de assistência ao índio.
§ 3° O grupo indígena envolvido, representado segundo suas formas próprias, participará do procedimento em todas as suas fases.
§ 4° O grupo técnico solicitará, quando for o caso, a colaboração de membros da comunidade científica ou de outros órgãos públicos para embasar os estudos de que trata este artigo.
§ 5º No prazo de trinta dias contados da data da publicação do ato que constituir o grupo técnico, os órgãos públicos devem, no âmbito de suas competências, e às entidades civis é facultado, prestar-lhe informações sobre a área objeto da identificação.
§ 6° Concluídos os trabalhos de identificação e delimitação, o grupo técnico apresentará relatório circunstanciado ao órgão federal de assistência ao índio, caracterizando a terra indígena a ser demarcada.
§ 7° Aprovado o relatório pelo titular do órgão federal de assistência ao índio, este fará publicar, no prazo de quinze dias contados da data que o receber, resumo do mesmo no Diário Oficial da União e no Diário Oficial da unidade federada onde se localizar a área sob demarcação, acompanhado de memorial descritivo e mapa da área, devendo a publicação ser afixada na sede da Prefeitura Municipal da situação do imóvel.
§ 8° Desde o início do procedimento demarcatório até noventa dias após a publicação de que trata o parágrafo anterior, poderão os Estados e municípios em que se localize a área sob demarcação e demais interessados manifestar-se, apresentando ao órgão federal de assistência ao índio razões instruídas com todas as provas pertinentes, tais como títulos dominiais, laudos periciais, pareceres, declarações de testemunhas, fotografias e mapas, para o fim de pleitear indenização ou para demonstrar vícios, totais ou parciais, do relatório de que trata o parágrafo anterior.
§ 9° Nos sessenta dias subseqüentes ao encerramento do prazo de que trata o parágrafo anterior, o órgão federal de assistência ao índio encaminhará o respectivo procedimento ao Ministro de Estado da Justiça, juntamente com pareceres relativos às razões e provas apresentadas.
§ 10. Em até trinta dias após o recebimento do procedimento, o Ministro de Estado da Justiça decidirá:
I – declarando, mediante portaria, os limites da terra indígena e determinando a sua demarcação;
II – prescrevendo todas as diligências que julgue necessárias, as quais deverão ser cumpridas no prazo de noventa dias;
III – desaprovando a identificação e retornando os autos ao órgão federal de assistência ao índio, mediante decisão fundamentada, circunscrita ao não atendimento do disposto no § 1º do art. 231 da Constituição e demais disposições pertinentes.
Art. 3° Os trabalhos de identificação e delimitação de terras indígenas realizados anteriormente poderão ser considerados pelo órgão federal de assistência ao índio para efeito de demarcação, desde que compatíveis com os princípios estabelecidos neste Decreto.
Art. 4° Verificada a presença de ocupantes não índios na área sob demarcação, o órgão fundiário federal dará prioridade ao respectivo reassentamento, segundo o levantamento efetuado pelo grupo técnico, observada a legislação pertinente.
Art. 5° A demarcação das terras indígenas, obedecido o procedimento administrativo deste Decreto, será homologada mediante decreto.
Art. 6° Em até trinta dias após a publicação do decreto de homologação, o órgão federal de assistência ao índio promoverá o respectivo registro em cartório imobiliário da comarca correspondente e na Secretaria do Patrimônio da União do Ministério da Fazenda.
Art. 7° O órgão federal de assistência ao índio poderá, no exercício do poder de polícia previsto no inciso VII do art. 1° da Lei n° 5.371, de 5 de dezembro de 1967, disciplinar o ingresso e trânsito de terceiros em áreas em que se constate a presença de índios isolados, bem como tomar as providências necessárias à proteção aos índios.
Art. 8° O Ministro de Estado da Justiça expedirá as instruções necessárias à execução do disposto neste Decreto.
Art. 9° Nas demarcações em curso, cujo decreto homologatório não tenha sido objeto de registro em cartório imobiliário ou na Secretaria do Patrimônio da União do Ministério da Fazenda, os interessados poderão manifestar-se, nos termos do § 8° do art. 2°, no prazo de noventa dias, contados da data da publicação deste Decreto.
Parágrafo único. Caso a manifestação verse demarcação homologada, o Ministro de Estado da Justiça a examinará e proporá ao Presidente da República as providências cabíveis.
Art. 10. Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 11. Revogam-se o Decreto n° 22, de 04 de fevereiro de 1991, e o Decreto n° 608, de 20 de julho de 1992.
Brasília, 8 de janeiro de 1996; 175º da Independência e 108º da República.
FERNANDO HENRIQUE CARDOSO
Nelson A. Jobim
José Eduardo de Andrade Vieira